terça-feira, 26 de março de 2013

Literatura comparada - Ensaio para um ensaio


Dialogismo, intertexto - interfaces

Tereza Ramos de Carvalho*

De acordo com o dialogismo bakhtiniano[1] “um texto só ganha vida em contato com outro texto, com o contexto. Somente nesse contato entre textos é que uma luz brilha, iluminando tanto o posterior como o anterior, juntando dado texto a um diálogo”. Nesse dialogismo é possível perceber como cada texto é concebido: como um intertexto numa sucessão de textos já escritos ou que ainda serão escritos. Para Bakhtin[2], o acontecimento na vida do texto sempre sucede nas fronteiras entre a consciência do autor e a do leitor. Porque esse ato de criação só pode ser compreendido no contexto dialógico de seu tempo.

Daí a necessidade de conhecer a relação do conteúdo da obra com o mundo e a intervenção, (forma), do autor no ato da criação literária. Ou seja, para que se reconheça essas interfaces entre autor, obra, leitor e contexto é necessário que haja a contextualização tanto do autor para a criação literária, quanto do leitor para compreensão e análise do texto.

Ao estudar e reconhecer o diálogo existente entre diferentes autores e obras, Bakhtin coloca em pauta as discussões sobre interdependência textual, que passa a ser objeto de estudo mais bem observado. Antes de Bakhtin[3], questionava-se a eficácia das pesquisas científicas no domínio das ciências da linguagem, porque se estudava a língua a partir de suas unidades mínimas e fragmentadas em sons, palavras e orações, o que não era suficiente para compreender a linguagem como fenômeno social. A partir dos estudos bakhtinianos a compreensão desse fenômeno linguístico toma novo rumo, pois ele se despe das técnicas até então tidas como modelo e busca compreender a linguagem como um diálogo que ocorre no meio de enunciados ou enunciados reais da comunicação, que congrega em si a bagagem sociocultural de um povo. Para Bakhtin[4] todo texto se reporta a outros textos, todo discurso remete a outros discursos.

A partir das teorias bakhtinianas, a crítica francesa Julia Kristeva[5] desenvolve e introduz o conceito de intertextualidade na década de 1960. Para Kristeva cada texto constitui um intertexto numa sucessão de textos já escritos ou que ainda serão escritos.  E qualquer texto se constrói como um mosaico de citações e é absorção e transformação de outro texto. Assim reforçamos a ideia de que um texto sempre pode ser intertexto de outro, quer pela alusão ou pela rejeição. É essa alusão intertextual que torna possível o diálogo entre duas ou mais vozes e, ainda, entre dois ou mais discursos, tanto escritos quanto falados, que embora sendo pessoal, congrega em si várias opiniões pertencentes ao social. 

*Professora Drª em Literatura


[1] In: Marxismo e filosofia da linguagem: problemas fundamentais do método sociológico na ciência da linguagem. São Paulo: HUCITEC, 1986, pag. 162.
 [2] O problema do texto. In Estética da criação verbal, 1997. Pags. 326 a 337. Textos de arquivos (1959-1961), Não revisto pelo autor.
[3]In: Koch, Ingedore G. Villaça. Intertextualidade: diálogos possíveis.  2ª. Ed. São Paulo: Cortez, 2008.
[4] O problema do texto, In: Estética da criação verbal. Trad. Maria Ermantina G. Pereira. São Paulo: Martins fontes, 1992.
[5]Introdução à semanálise. São Paulo: Perspectiva: 1974, Citada por Koch, Ingedore G. Villaça. Intertextualidade: diálogos possíveis. pag. 14. 

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